
Ministério da Saúde se prepara para regulamentar a Lei da Pesquisa Clínica: o que esperar?
A tão aguardada regulamentação da Lei da Pesquisa Clínica em Seres Humanos (Lei nº 14.874/2024) está prestes a sair do papel. Segundo a secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico Industrial da Saúde (SECTICS), Fernanda De Negri, o texto do decreto já foi finalizado e será enviado em breve à Casa Civil para publicação até setembro.
A entrevista, concedida ao portal JOTA, antecipa pontos estratégicos da nova regulamentação, que deve transformar a condução da pesquisa clínica no Brasil, trazendo mais agilidade, segurança e autonomia ética para os envolvidos.
Classificação de risco: uma análise mais eficiente
Um dos avanços mais importantes da regulamentação será a adoção da classificação de risco das pesquisas, permitindo uma análise proporcional à complexidade do estudo. Pesquisas com risco muito baixo, como aquelas em ciências sociais e humanas, poderão passar por fluxos mais simples, liberando tempo e recursos para avaliações mais exigentes.
Essa medida tem como objetivo organizar melhor a fila e acelerar o processo de aprovação, algo há muito demandado por patrocinadores, pesquisadores e centros de pesquisa.
Criação da Instância Nacional de Ética em Pesquisa
A nova regulamentação formaliza a criação da Instância Nacional de Ética em Pesquisa, órgão que substituirá a atual Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) na coordenação do sistema. Essa instância será ligada ao Ministério da Saúde, mas com autonomia técnica e decisória, conforme previsto na lei.
Segundo Fernanda De Negri, a composição será equilibrada, com representantes da comunidade científica, controle social, Conselho Nacional de Saúde, Anvisa, e outros ministérios como o da Ciência e Tecnologia. O objetivo é garantir diversidade, qualidade técnica e representatividade nas decisões éticas.
Acreditação de Comitês de Ética: mais autonomia, mais responsabilidade
A nova regra também prevê um sistema de credenciamento e acreditação dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs). Os comitês que obtiverem acreditação especial poderão analisar estudos de alto risco, ampliando sua autonomia em relação ao sistema atual.
Essa descentralização permitirá que um número maior de análises seja feito diretamente nos CEPs locais, contribuindo para mais agilidade sem abrir mão da qualidade.
Regimento, mandatos e edital público
A Instância Nacional deverá elaborar seu próprio regimento interno, com definição da frequência das reuniões, processo de escolha dos membros (via edital), mandatos definidos, e regras de transição claras para garantir uma migração segura do sistema CEP-CONEP.
Durante esse período de transição, a Plataforma Brasil continuará ativa, e as resoluções da CONEP seguirão em vigor até que novas diretrizes sejam publicadas.
Sistema integrado de registros e plataforma mais eficiente
Outro ponto muito esperado pelo setor é a melhoria do sistema informatizado de registros. A atual Plataforma Brasil enfrenta críticas por lentidão e baixa responsividade. A proposta é criar uma plataforma integrada com a Anvisa, permitindo maior interoperabilidade entre o registro ético e o regulatório.
A nova plataforma deve facilitar o trabalho de pesquisadores e patrocinadores, tornando o processo mais transparente, centralizado e ágil.
Acompanhamento de voluntários e acesso a medicamentos
O decreto também estabelecerá diretrizes para o acompanhamento dos participantes de pesquisa após o estudo, em especial no que se refere ao programa de fornecimento de medicamentos pós-estudo, previsto na nova lei com um prazo de até cinco anos após o encerramento do ensaio.
Os detalhes sobre esse acompanhamento deverão ser regulamentados posteriormente pela Instância Nacional de Ética em Pesquisa.
Um salto estratégico para a ciência e a saúde no Brasil
A secretária Fernanda De Negri destaca que o Brasil, apesar de ter capacidade científica e diversidade populacional, ainda tem baixa produtividade em pesquisa clínica. A nova regulamentação visa mudar esse cenário, tornando o país mais competitivo, atraente e confiável para condução de estudos.
Segundo ela, o avanço na regulação poderá fortalecer o Complexo Econômico-Industrial da Saúde, gerar inovação nacional e atrair investimentos em pesquisa e desenvolvimento.
Conclusão
A regulamentação da Lei de Pesquisa Clínica é um marco aguardado com expectativa por toda a comunidade científica e pelo setor regulado. Com a previsão de publicação até setembro, o novo decreto pode finalmente destravar o potencial do Brasil como protagonista em pesquisa clínica — sem abrir mão da segurança, da ética e da qualidade científica.
Nos próximos meses, o foco estará na transição, na implementação prática das novas diretrizes e no fortalecimento das estruturas que sustentarão esse novo sistema. É o momento de acompanhar de perto e se preparar para uma nova era da pesquisa clínica no país.
Fonte: Jota.Info