Lei 14.874/24: Desafios e Avanços para a Pesquisa Clínica no Brasil
Em 28 de maio de 2024, foi sancionada a Lei 14.874/24, marco regulatório que estabelece princípios, diretrizes e regras para a condução de pesquisas com seres humanos no Brasil. A nova lei também institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, prometendo avanços importantes, mas enfrentando desafios que, até o momento, limitam sua aplicação plena.
Um Sistema Ainda em Transição
Atualmente, o Sistema CEP/Conep é o responsável pela regulação ética em pesquisas com seres humanos. Esse sistema, formado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e pelos Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs), permanece em vigor, mesmo com a previsão de substituição pelo Sistema Nacional de Ética em Pesquisa (SNEP). Porém, a transição para o novo sistema depende da publicação de um decreto do Poder Executivo, necessário para sua regulamentação e implementação.
Essa situação peculiar gera um cenário de coexistência entre dois sistemas: o atual, baseado na Resolução CNS 466/2012, e o previsto pela nova lei. Sem o decreto regulamentador, a Lei 14.874/24 ainda não pode ser aplicada em sua totalidade, perpetuando inseguranças jurídicas e dificultando o avanço da pesquisa clínica no país.
Principais Mudanças Introduzidas pela Lei
Entre os avanços trazidos pela nova legislação, destacam-se:
- Fim da Dupla Instância de Aprovação Ética: Ao contrário do sistema atual, em que a Conep atua como instância de revisão ética, a Lei 14.874/24 confere aos CEPs competência exclusiva para a análise ética de protocolos de pesquisa.
- Celeridade nos Processos: A lei define prazos claros para a análise ética, buscando reduzir a demora na tramitação dos projetos.
- Análise Centralizada em Pesquisas Multicéntricas: Pesquisas realizadas em múltiplos centros serão analisadas por um único CEP, preferencialmente o vinculado ao centro coordenador da pesquisa. Isso visa simplificar e acelerar o processo.
- Continuidade do Tratamento Pós-Ensaio: A lei regulamenta o fornecimento de medicamentos experimentais após o término dos estudos, estabelecendo critérios claros para continuidade ou interrupção do tratamento, sempre com foco na segurança e bem-estar dos participantes.
Lacunas e Inseguranças
Embora apresente avanços, a Lei 14.874/24 enfrenta críticas por suas lacunas. Com 36 dispositivos aguardando regulamentação, a falta de clareza em aspectos fundamentais impede sua plena efetividade. Entre os desafios estão:
- Dependência de Regulamentação: Muitos pontos cruciais, como a instituição do SNEP e os detalhes sobre a análise ética, dependem de atos do Poder Executivo.
- Conflito de Normas: A coexistência entre o Sistema CEP/Conep e o futuro SNEP cria incertezas quanto à aplicação das regras.
- Falta de Detalhamento: Termos como o regramento dos CEPs e os critérios de aprovação ética carecem de definições claras, dificultando a operacionalização da lei.
O Caminho para o Pleno Potencial
Para que a Lei 14.874/24 alcance seu objetivo de fomentar a ética e o desenvolvimento científico, é imprescindível que o Poder Executivo avance na regulamentação. O alinhamento normativo, combinado com a eliminação de incertezas, pode transformar a pesquisa clínica no Brasil, promovendo segurança jurídica, avanço tecnológico e inovação.
A trajetória é desafiadora, mas com os ajustes necessários, a nova lei tem o potencial de colocar o Brasil em um patamar mais elevado na condução de estudos clínicos, beneficiando pesquisadores, participantes e a sociedade como um todo.